3.9.14

O CONTRATO NA CONTEMPORANEIDADE

Bom dia amigos, segue abaixo a análise feita por mim do Contrato na Contemporaneidade, explorando o Contrato após a mudança de paradigmas. Boa leitura!!!

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O CONTRATO NA CONTEMPORANEIDADE
André Silveira

O paradigma da Modernidade foi ultrapassado diante da evolução e expansão social que o sucederam, momento em que surgiram novas exigências para essa sociedade que nascia, no sentido de criar oposição à razão totalizadora do pensamento jurídico Moderno, o movimento de passagem do individualismo ao solidarismo, ou solidariedade social, expressa na nova concepção de pessoa, tendo não mais o sujeito caráter abstrato e imposto à forma da Modernidade, mas a pessoa engajada no seu meio social.[1]
Também seguem como fatores de derrubada da Modernidade e do Estado Liberal, o pluralismo das fontes de direito e a importância crescente dos princípios jurídicos na gênese da norma jurídica aplicável ao caso concreto, a possibilidade e o reconhecimento da individualização e concretude destas normas, o que resulta a afirmação de que todos estão expostos a uma sociedade de “risco”, e a desagregação do direito civil em corpos jurídicos autônomos (por exemplo, o Código de Defesa do Consumidor), dotados de princípios e unidades próprias, que passam a constituir novos ramos do direito, regulando, inclusive, a seara contratual, diante de uma sociedade amplamente modificada.[2] 
Diferentemente do que traz Enzo Roppo, que “a verdade é que não existe uma “essência” histórica do contrato; existe sim o contrato, na variedade das suas formas históricas e das suas concretas transformações “[3], fazendo alusão à evolução do contrato diante das novas exigências sociais.
Muitos autores, como, por exemplo, Grant Gilmore, preconizaram isso como uma crise do contrato, o fim da idade de ouro do mesmo, e até a morte do contrato[4], como se este não fosse capaz de acompanhar o ritmo da sociedade a partir de então.
Consagrando a mudança do paradigma contratual, o Estado Liberal, após a primeira guerra mundial, é substituído pelo Estado Social de Direito, caracterizado pela ação intervencionista no domínio econômico, tendo como principal objetivo o bem estar social.[5]
Com a substituição do Estado Liberal pelo Social de Direito no século XX, o foco do Estado voltou-se ao cuidado e a proteção dos direitos econômicos e sociais dos cidadãos, limitando, assim, a vontade e a liberdade individual, partindo da premissa de que grande parte dos contratantes encontra-se em situação notoriamente diversa, ocorrendo um desequilíbrio da relação, seja no campo econômico, moral ou técnico, e até mesmo de discernimento da situação presente na relação contratual.[6]
Fez-se necessária, então, a intervenção estatal, a preocupação do Estado neste tipo de relação, pois o desequilíbrio era flagrante, sendo preciso implantar mecanismos que visassem proteger o interesse coletivo.
O Estado Social é considerado resultado de uma composição entre liberalismo e socialismo, que no Século XX exigiu, por meio da produção em massa e da concentração de capital, a atenção no que tange as relações entre Estado e sociedade, tendo em vista a eliminação da tensão provocada entre capital e trabalho, dando vazão a uma mudança de paradigma social.[7]
Este momento histórico caracterizado pela intervenção estatal como redutora de desigualdades busca, por meio da interferência legislativa, criar regramentos específicos que limitam o poder jurígeno dos negociantes, e, para além disso, amplia suas atividades e promove um rigoroso controle da economia.[8]
Observando-se o fato de que a ordem jurídica que prometia a igualdade política não encontrava maneiras de estar apta a ensejar a igualdade econômica, exigiu-se do Estado novo comportamento, de modo que, este, a partir deste momento histórico, passa a intervir nos negócios jurídicos, restringindo os limites da atuação da vontade das partes, fenômeno que se denominou dirigismo contratual, e que tem por finalidade proteger o economicamente mais fraco do jugo dos poderosos, minimizando as diferenças existentes no plano concreto.[9]
Neste condão, voltando-se contra os desvios provocados pela auto-regulação do mercado, o Estado interfere na esfera econômica, instaurando o dirigismo econômico, passando a dirigir e controlar o processo produtivo para redistribuir o produto social. Vale-se de uma política fiscal capaz de promover os serviços de utilidade social e conferir aos cidadãos condições de existência, que os integrem no tecido social.[10]
A intervenção do Estado na economia trouxe diversas modificações também na ambiência do contrato, sendo que, no novo contexto determinado por esta política de intervenção, o contrato sofreu duas principais modificações em sua significação e em sua função, em que deixa de ser apenas expressão da autonomia privada e passa a ser uma estrutura de conteúdo complexo e híbrido, com disposições voluntárias e compulsórias, nas quais a composição dos interesses reflete o antagonismo social entre as categorias a que pertencem os contratantes.[11]
Esta intervenção estatal trazida com o Estado Social deu-se no momento em que o desequilíbrio era patente, pois, a relação contratual no Estado Liberal dava a falsa suposição de igualdade e equilíbrio contratual, a partir da idéia de liberdade presente naquela época, que, de fato, facilitava a dominação de uma classe economicamente mais forte em detrimento de uma mais frágil.
No Estado Social (welfare state) todos os temas sociais juridicamente relevantes foram constitucionalizados. Este momento histórico caracteriza-se exatamente por controlar e intervir em setores da vida privada antes interditados à ação pública pelas constituições liberais. No Estado Social, portanto, não é o grau de intervenção legislativa, ou de controle do espaço privado, que gera a natureza de direito público.[12]
Com o contrato ingressando nas constituições e evoluindo nas codificações, refletindo o novo paradigma social, princípios também tiveram de ser incorporados ao seu corpo. Princípios[13] que refletem a concepção que o contrato adquiriu, sendo, um deles o da função social do contrato, princípio que serve como baliza a atuar quanto à tutela dos efeitos externos produzidos pelos negócios jurídicos, delimitando que estes não produzam efeitos danosos à sociedade como um todo.[14]
Outro princípio de suma importância nesta fase do contrato é o princípio da boa-fé objetiva, que merece ser lido dentro de seu contexto plurissignificativo, se fazendo mister no momento de integrar o conteúdo do negócio nos pontos lacunosos e para vedar a inserção de cláusulas que violem o princípio[15], como explicita um recente julgado do TJSP[16] sobre o assunto.
Princípio, este, que necessariamente deve estar presente em todos os negócios jurídicos, pois este age como norteador da relação jurídica, limitando, muitas vezes, o exercício de direitos.[17]
Dos essenciais princípios que o contrato absorveu em sua concepção mais social, o último é o da equivalência material, o qual versa acerca do fundamental equilíbrio que deve estar presente em toda e qualquer relação jurídica exercida pelas partes, objetivo pelo qual veio reduzir as desigualdades deixadas de herança pelo entendimento Liberal, visando a equivalência concreta entre as prestações.[18]
Estes princípios contratuais e esta noção modificada de sociedade trazida pelo Estado Social mostram que o interessante não é mais a exigência cega de cumprimento do contrato, da forma como foi assinado ou celebrado, mas se sua execução não acarreta vantagem excessiva para uma das partes e desvantagem excessiva para a outra, o que consagra o principio da equivalência material das prestações, que perpassa todos os fundamentos constitucionais a ele aplicáveis, sugerindo um equilíbrio preponderante na relação contratual.[19]
Mesmo assim, diante a adoção de tal postura, o liame contratual continuou com uma crescente distorção social, pois a classe burguesa adaptou-se rapidamente ao rompimento havido e continuava a enriquecer em prejuízo do empobrecimento de grande parte da sociedade.[20]
Diante deste contexto social e econômico, a ideologia contratual teve de se adaptar as novas exigências que historicamente foram sendo delineadas, exigindo do direito civil uma releitura de sua disciplina legal e jurisprudencial, de suas funções e de sua própria estrutura.[21]
A partir desse desequilíbrio não demorou o início de uma crise do modelo de Estado Social: ao mesmo tempo em que a escassez de suas políticas públicas coloca em risco os direitos fundamentais e sociais, elas não se revelam como escolhas da sociedade, mas de pequenos grupos que se alteram no poder, colocando em xeque o princípio democrático.[22]
Diz-se então, que os direitos fundamentais deparam-se, no interior desse Estado, com as dificuldades de sua realização. Eis que o valor desses direitos decorre antes de sua eficácia do que de sua idealidade.[23]
Ao Estado Social sucedeu o Estado Democrático de Direito, que se caracteriza pela institucionalização da convergência da democracia e do socialismo, superando o neocapitalismo próprio do Estado Social.[24]
Neste momento o Estado volta-se para um novo paradigma, no qual possa encontrar a superação da crise do modelo social, encontrando, o Estado Democrático de Direito, acolhida nas Constituições, o que representa um salto em relação ao modelo intervencionista[25], na medida em que confere ao Direito uma função transformadora e desloca o ponto de tensão entre Estado e sociedade do Executivo para o Judiciário. Especialmente em sua jurisdição constitucional, atribui-se aos juízes poder para avaliar as medidas de bem-estar social, propostas pelos governantes, conferindo-lhes um “peso democrático". Nessa perspectiva, o Estado Democrático de Direito mostra-se como uma fórmula indissolúvel, que liga democracia e realização dos direitos fundamentais.[26]
No período social anterior buscou-se a ação dos poderes públicos para que se desenvolvessem mecanismos contratuais favoráveis à coletividade[27], ao passo que o Estado Democrático de Direito é o momento de – teórica – realização das reivindicações do Estado Social, impondo-se a real democracia e a justiça social, bem como o aparente equilíbrio contratual.
Tornando-se essencial que o contrato, ao permitir a satisfação das necessidades das partes, o faça em conformidade com os anseios da justiça social presente.[28] Consagrando, assim, a verdadeira democracia perdida no Estado Social ao passo que as desigualdades em favor de alguns grupos tornavam-se superiores.
Estas oscilações políticas e sociais, que descortinam o Estado Democrático de Direito, têm decisiva influência no contrato. Trazendo consigo o “projeto de uma nova sociedade”, de uma mudança de paradigma não só prático, mas interpretativo, os textos constitucionais acolhem os princípios de direito privado[29]: o contrato definitivamente ingressa na visão constitucional.[30]
No Estado Democrático de Direito, os valores e princípios fundamentais do direito privado transitam para a esfera política. Ao transpor as barreiras que separavam o público do privado, o Estado toma para si a tarefa de proteção e realização dos direitos fundamentais e de pleno desenvolvimento da pessoa. Trata-se da esfera política definindo os valores do direito privado e conferindo-lhe feição democrática. Com efeito, o contrato, situação subjetiva patrimonial construída sob a inspiração do liberalismo, é chamado a funcionalizar-se às relações existenciais.[31]
A principiologia contratual contemporânea, desenhada pela força normativa da Constituição, elege como valor a pessoa, não mais a irrestrita idéia de propriedade no centro gravitacional dos negócios jurídicos.[32]
Portanto, o Estado Democrático de Direito veio concretizar os ideais sociais e os princípios mentalizados na vigência do Estado Social de Direito, adaptando-se a uma realidade cada vez mais fluida e rápida, que gerou uma massificação das relações negociais (e dos contratos), fazendo necessária esta adaptação.


[1] AMARAL, Francisco. O Direito Civil na Pós-Modernidade. In: FIUZA, César; SÁ, Maria de Fátima Freire de; NAVES, Bruno Torquato de Oliveira (Org.). Direito civil: atualidades. Belo Horizonte: Del Rey, 2003. p.74-76.
[2] AMARAL, loc.cit.
[3] ROPPO, Enzo. O contrato. trad. Ana Coimbra e M. Januário C. Gomes. Coimbra: Almedina, 2009. p.348.
[4] BARROSO, Lucas Abreu. Evolução histórica. In: MORRIS, Amanda Zoe; BARROSO, Lucas Abreu (Coord.). Direito dos contratos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p.34.
[5] AMARAL, Francisco. O Direito Civil na Pós-Modernidade. In: FIUZA, César; SÁ, Maria de Fátima Freire de; NAVES, Bruno Torquato de Oliveira (Org.). Direito civil: atualidades. Belo Horizonte: Del Rey, 2003.p.72.
[6] THEODORO JÚNIOR, Humberto. O contrato e seus princípios. 3. ed. Rio de Janeiro: Aide, 2001. p.63.
[7] PINHEIRO, Rosalice Fidalgo. Contrato e Direitos Fundamentais. Curitiba. Juruá, 2009. p.35.
[8] CATALAN, Marcos Jorge. Descumprimento contratual: modalidades, consequências e hipóteses de exclusão do dever de indenizar. 1. ed. Curitiba: Juruá, 2010. p.63.
[9] CATALAN, Marcos Jorge. Descumprimento contratual: modalidades, consequências e hipóteses de exclusão do dever de indenizar. 1. ed. Curitiba: Juruá, 2010. p.63.
[10] PINHEIRO, Rosalice Fidalgo. Contrato e Direitos Fundamentais. Curitiba. Juruá, 2009. p.36.
[11] GOMES, Orlando. Contratos. 26. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007. p.17.
[12] LOBO, Paulo Luiz Netto. Constitucionalização do Direito Civil. In: FIUZA, César; SÁ, Maria de Fátima Freire de; NAVES, Bruno Torquato de Oliveira (Org.). Direito civil: atualidades. Belo Horizonte: Del Rey, 2003. p.200.
[13] Vide CATALAN, Marcos Jorge. Descumprimento contratual: modalidades, consequências e hipóteses de exclusão do dever de indenizar. 1. ed. Curitiba: Juruá, 2010. ”O contrato, em maior ou menos intensidade, desde a antiga Roma até o inicio do século passado, inspirou-se em quatro princípios, ditos clássicos, sendo eles: a autonomia da vontade, o pacta sunt servanda, a relatividade dos efeitos dos contratos e o consensualismo, e em síntese, satisfazia aos interesses egoísticos e individualistas dos mais fortes em detrimentos dos menos favorecidos, na medida em que pertencia a um direito que servia como instrumento de dominação social.” p.72.
[14] CATALAN, Marcos Jorge. Descumprimento contratual: modalidades, consequências e hipóteses de exclusão do dever de indenizar. 1. ed. Curitiba: Juruá, 2010. p.72.
[15] ZANETTI, Cristiano de Souza. Princípios. In: MORRIS, Amanda Zoe; BARROSO, Lucas Abreu (Coord.). Direito dos contratos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p.68.
[16] TJSP. Ap. Cível Nº. 0141960-86.2010.8.26.0100. 29ª Câmara de Direito Privado. Rel.Des. Reinaldo Caldas.: “Os autores, funcionários aposentados do Banco do Estado de São Paulo S/A, por meio da Caixa Beneficente dos Funcionários do Banco do Estado de São Paulo S/A - CABESP, aderiram, em l i d e maio de 1973 (fl. 65), ao seguro de vida em grupo mantido pela seguradora ré (apólice n° 19300000010 - "Apólice 10"), com desconto mensal do prêmio em folha e, posteriormente, por débito em conta corrente. Em maio de 2005, a seguradora comunicou aos autores (fl. 71) que não seria renovada a apólice do seguro, em face do disposto no item 8.4. das condições gerais e nos artigos 26 e 28 das Normas para o Seguro de Vida em Grupo, aprovadas pela circular SUSEP n° 1 7 de 17/7/1992, ou seja, expiraria o seu prazo de validade às 24h00 do dia 31 de maio de 2005 e não havia interesse na continuidade da relação contratual. Como se infere dos autos, depois de trinta e dois longos anos de regular pagamento do prêmio securitário, a seguradora simplesmente deliberou romper o contrato, negando-se a renová-lo sob o argumento de expiração de seu prazo de validade e desinteresse na renovação. Ao fazê-lo, retirou dos segurados, no ocaso da vida, a tranqüilidade de saber que, em caso de sinistro, seus familiares receberiam o valor do seguro, de modo a fazer frente à incógnita do porvir. Essa atuação não pode passar incólume ao crivo do Judiciário, pois que se constitui, sob a capa de exercício regular de direito, manifesto abuso, verdadeiro ato ilícito; abuso que, se previsto em cláusula contratual, também a contamina. Houve evidente maltrato ao princípio da boa-fé contido em todo contrato e notadamente no contrato de seguro, consoante disposto no artigo 765 do Código Civil. Inaplicáveis as disposições dos artigos 760, caput do Código Civil e 5º, inciso II e § 2º da Constituição Federal, como quer a ré, porque não se cogita de lesão aos princípios da legalidade, da autonomia da vontade e da liberdade de contratar, mas, ao contrário, de direito à reparação civil decorrente de ato violador do direito da parte autora, consistente na abusiva e injusta recusa de renovação do contrato, sem disponibilizar alternativas outras que pudessem minimizar as conseqüências do fato. Basta lembrar que foram trinta e uma renovações desde a primeira contratação e como de sua denominação, o seguro contratado visava à garantia de toda a vida dos autores e não somente de parte dela, não se justificando que, ao chegar no limiar da velhice, ante a real perspectiva de pagamento da indenização securitária por um dos eventos cobertos, ou seja, morte ou invalidez permanente, possa a seguradora simplesmente ignorar os autores segurados, reduzidos à condição de produtos descartáveis e meros "contribuintes" por longos 32 anos, sem direito a nada, sob o surrado argumento do "comprometimento do equilíbrio financeiro". Mais do que adjetivações indigestas, a atuação da seguradora representa inequívoca afronta ao disposto nos artigos 4o, inciso III e 51, incisos IV e XV, e parágrafo I o do Código de Defesa do Consumidor, escusada aqui a sua transcrição por óbvio. Não é só. Houve também grave violação aos princípios da probidade e da boa-fé previstos nos artigos 113 e 422 do Código Civil, que impõem às partes o resguardo, tanto na conclusão quanto na execução dos contratos, à conduta proba e de boa-fé. Enfim, cláusula contratual que garanta a não renovação do contrato, após trinta e dois anos, depois de simples notificação prévia enviada ao segurado, é não só abusiva como profundamente injusta, razão pela qual não pode prevalecer porque agride os princípios da probidade e da boa-fé, além de impor ao contratante a visualização de um futuro incerto e inseguro para seus beneficiários. Juridicidade conecta-se com legitimidade do direito. Tão ilegítima é a atuação de quem malfere a norma jurídica, como a de quem abusa do próprio direito, exercendo-o de modo imoderado, excessivo e sem nenhum resultado útil à sociedade. Idêntico o raciocínio, em se tratando de contrato, em especial o de seguro. A prevalecer a possibilidade de, após trinta e dois anos de regular pagamento do prêmio pelo segurado, poder a seguradora simplesmente negar-se à renovação do contrato mediante a singela justificativa de que isso está previsto no ajuste e decorre do "equilíbrio financeiro" supostamente em risco, estará chancelado o desrespeito à dignidade da pessoa idosa. Houve, em suma, exercício abusivo do direito, com a conseqüente obrigação de reparar o dano. Assim, têm os autores direito à indenização, consoante disposto nos artigos 186 do Código Civil, 5o, incisos V e X da Constituição Federal e 6o, inciso VI, do Código de defesa do Consumidor.”
[17] CATALAN, Marcos Jorge. Descumprimento contratual: modalidades, consequências e hipóteses de exclusão do dever de indenizar. 1. ed. Curitiba: Juruá, 2010.p.79.
[18] MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no código de defesa do consumidor: o novo regime das relações contratuais. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. p.391.
[19] LOBO, Paulo Luiz Netto. Constitucionalização do Direito Civil. In: FIUZA, César; SÁ, Maria de Fátima Freire de; NAVES, Bruno Torquato de Oliveira (Org.). Direito civil: atualidades. Belo Horizonte: Del Rey, 2003. p.215.
[20] CATALAN, Marcos Jorge. Descumprimento contratual: modalidades, consequências e hipóteses de exclusão do dever de indenizar. 1. ed. Curitiba: Juruá, 2010. p.63.
[21] BARROSO, Lucas Abreu. Evolução histórica. In: MORRIS, Amanda Zoe; BARROSO, Lucas Abreu (Coord.). Direito dos contratos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p.34.
[22] PINHEIRO, Rosalice Fidalgo. Contrato e Direitos Fundamentais. Curitiba. Juruá, 2009. p.37.
[23] PINHEIRO, loc.cit.
[24] AMARAL, Francisco. O Direito Civil na Pós-Modernidade. In: FIUZA, César; SÁ, Maria de Fátima Freire de; NAVES, Bruno Torquato de Oliveira (Org.). Direito civil: atualidades. Belo Horizonte: Del Rey, 2003. p.73.
[25] Vide AMARAL, Francisco. O Direito Civil na Pós-Modernidade. In: FIUZA, César; SÁ, Maria de Fátima Freire de; NAVES, Bruno Torquato de Oliveira (Org.). Direito civil: atualidades. Belo Horizonte: Del Rey, 2003. Aspectos que apontam a superação do paradigma moderno:  “a) A incapacidade do direito moderno de responder a questões fundamentais como, por exemplo, a justiça social, o bem comum, e as pertinentes ao início e fim da personalidade e dos seus efeitos, assim como também a “inadequação metodológica relativamente ao problema concreto específico da realização do direito; b) Um certo retorno ao irracionalismo, no sentido de oposição à razão totalizadora do pensamento jurídico da modernidade; c) A passagem do individualismo ao solidarismo, ou solidariedade social, expressa na nova concepção de pessoa, não mais o sujeito abstrato e forma da modernidade, mas a pessoa engajada no seu meio social; d) O pluralismo das fontes de direito e a importância crescente dos princípios jurídicos na gênese da norma jurídica aplicável ao caso concreto; e) A possibilidade e o reconhecimento da individualização e concretude das normas jurídicas que levam em consideração os aspectos particulares dos casos concretos; f) A perda da certeza jurídica, a insegurança e a incerteza jurídica no direito com a conseqüente imprevisibilidade do que resulta a afirmação de que vivemos em uma sociedade de risco; g) A superação do formalismo jurídico, que levava ao “isolamento e alheamento dogmático das exigências e dos problemas histórico-sociais reais e actuais”, em prol de uma tendência
à “materialização” do direito, isto é, uma tendência ao particularismo jurídico na criação do direito e à utilização de razões materiais pelos órgãos aplicadores do direito. Conseqüentemente, o direito não se apresenta mais como um sistema completo e coerente, capaz de dar resposta a todas as questões jurídicas; h) A constitucionalização dos princípios fundamentais do direito privado, no sentido da sua recepção pelo texto constitucional, que passa a ser o estatuto central da sociedade civil e política, e, conseqüentemente, a perda da centralidade sistêmica do Código Civil, própria do direito moderno; i) A desagregação do direito civil em corpos jurídicos autônomos, dotados de princípios e unidades próprias, que passam a constituir novos ramos do direito. Esse processo representa uma antítese no processo histórico da codificação, sendo, por isso mesmo, conhecido como a descodificação do direito civil; j) Relativização da dicotomia Estado x Sociedade Civil, ou público x privado, surgindo um terceiro setor, o dos interesses públicos, porém não estatais, ora a cargo de entidades ou associações não-governamentais; l) Superação do principio da divisão dos poderes na criação e aplicação do direito, reconhecendo-se que aplicar é também criar direito; m) Crise e até superação da idéia do direito como sistema de normas hierárquicas e axiomáticas. O direito deixa de ser visto como um sistema de normas e passa a ser visto como sistema de procedimentos, superando-se o pensamento sistemático em prol do pensamento problemático; o) Personalização do direito civil, no sentido da crescente importância da vida e da dignidade da pessoa humana, elevados à categoria de direitos e de principio fundamental da Constituição, donde o reconhecimento de um novo e importante ramo jurídico, o dos direitos da personalidade, direitos fundamentais ou humanos, que “constituem o núcleo das Constituições dos sistemas jurídicos contemporâneos”. p.74- 76.
[26] PINHEIRO, Rosalice Fidalgo. Contrato e Direitos Fundamentais. Curitiba. Juruá, 2009. p.37-38.
[27] LYRA JUNIOR, Eduardo Messias Gonçalves de. Os princípios do direito contratual. Revista de  Direito Privado. São Paulo. n.12. out/dez 2002. p.150.
[28] Ibid. p.154.
[29] TJSP. Ap.Cível Nº 0028104-58.2009.8.19.0203. 2ªCC. Rel. Des. Mauricio Caldas Lopes.: ” Ação revisional de cláusula contratual.Contrato de financiamento imobiliário firmado em 30/01/1990.Propaganda veiculada pela Caixa de Financiamento Imobiliário da Aeronáutica, agente financeiro do SFH, prometendo financiamento 20% abaixo do preço de mercado e sem resíduo do saldo devedor, não observados, entretanto, pelo credor financeiro.Sentença de procedência para declarar nula a cláusula vigésima quarta e parágrafos do contrato, com posterior baixa do gravame, tão logo quitadas as prestações pactuadas, sob pena de multa a ser fixada. Apelação Código de Defesa do Consumidor. Contrato revidendo firmado antes da vigência do CDC, circunstância que, em linha de princípio, afastaria a incidência do diploma consumerista.Em linha princípio porque, na verdade, a Lei 8.078/90 apenas detalhou os meios e modos de proteção ao consumidor, objeto, desde antes, de enfática disposição constitucional, qual a do inciso XXXII do artigo 5º da Constituição da República, princípio puro a partir de sua dimensão institucional ou objetiva, aparentemente condicionada a interpositio legislatoris que a identificação de seus pretendidos efeitos dispensava.Desigualdade material e técnica dos autores, diante de autênticos nichos do poder -econômico é bem verdade, mas poder --, que já demandava sua enfática proteção como decorrência mesmo dos efeitos irradiantes dos direitos fundamentais num estado de direito democrático que privilegia, ainda que nas relações contratuais em geral, a ética e a boa-fé que se insinuam como limites da liberdade contratual e de executar as obrigações contratadas.Objeto do contrato - imóvel para moradia, que compõe sem dúvida alguma o mínimo social sem o qual nenhuma pessoa é materialmente livre, tanto no sentido pensado por John Rawls, como por Alexy.Financiamento de NCz$ 573.621,93 (quinhentos e setenta e três mil, seiscentos e vinte e um cruzados novos e noventa e três centavos), a serem pagos em 240 prestações, quitadas, quando do ajuizamento da ação, 232 delas.Saldo residual de R$ 224.614,84 (duzentos e vinte e quatro mil, seiscentos e quatorze reais e oitenta e quatro centavos), a ser resgatado em mais 120 (cento e vinte) parcelas, fixado e apresentado unilateralmente pelo credor, já na vigência do Código de Defesa do Consumidor, a cujos efeitos imediatos não poderia se subtrair o pacto, pelo menos no que respeita a tal saldo. Efeitos imediatos da lei nova que não se confundem, em absoluto, com sua retroatividade, ainda mais quando se considere a natureza do contrato, de trato contínuo ou sucessivo, diferida no tempo a constatação de eventual saldo devedor, unilateralmente -- insista-se -- estabelecido pelo vendedor.Fins sociais do contrato e natureza consumerista da relação que bem justificam a sujeição do contrato revidendo, no particular aspecto da cláusula impugnada, aos efeitos imediatos da lei nova. Cláusula, ademais, puramente potestativa.O Código Civil de 1.916, sob cuja égide fora elaborado o contrato, era expresso no sentido de que é nula a cláusula que deixe a critério exclusivo de uma das partes, a fixação do preço do negócio, assim como também o são o Código Civil de 2.002 e o Código de Defesa do Consumidor.A Colenda 24ª Câmara de Direito Privado do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, em V. Acórdão relatado pelo eminente Desembargador Roberto Mac Cracken, acolheu a tese de que nos contratos de crédito imobiliário regidos pelo Sistema Financeiro da Habitação é impossível, juridicamente, a cobrança de "saldo residual", unilateralmente fixado pelo credor, depois de integralmente pagas todas as prestações contratualmente previstas, exibindo-se nulas de pleno direito as cláusulas que assim disponham, notadamente à vista de sua abusividade, a impedir que o consumidor/o comprador tenha conhecimento pleno do total a pagar ou, se quiser, consciência e ciência integrais do pacto e de suas consequências e implicações, para, no exercício da liberdade contratual, optar pelo que melhor lhe conviesse aos interesses. (TJSP, 24ª Câmara Cível, rel. o Desembargador Roberto Mac Cracken, http://www.mackenzie.br/fileadmin/Graduacao/FDir/Ar tigos/roberto.pdf)Assim, puramente potestativa a cláusula que deixa ao critério exclusivo de uma das partes a fixação do preço final do negócio, resulta ela absolutamente nula como declarado em 1º grau, sem prejuízo da violação dos deveres de cautela, cuidado e lealdade a que vinculado o fornecedor de bens ou serviços, em decorrência da boa fé (art. 4º, III, CDC) que preside as relações de consumo, em ordem a proteger o consumidor, a parte mais frágil da relação de consumo -- princípio da vulnerabilidade, art. 4º, I, c/c o inciso IV, do art. 6º CDC.Proibição de negativação do nome dos autores mantida, quitadas que se encontram todas as 240 parcelas contratadas.Recurso a que se nega seguimento.

[30] PINHEIRO, Rosalice Fidalgo. Contrato e Direitos Fundamentais. Curitiba. Juruá, 2009. p.38.
[31] PINHEIRO, loc.cit.
[32] Ibid. p.40.

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